Thursday, April 26, 2007

feridas escondidas debaixo da pele...

A soap
Grande prémio do júri e melhor primeira obra no Festival de Berlim, "Sexualidades" é a história de Charlotte e de Veronica, um transexual. Veronica prefere ficar em casa sozinha com o seu cão, a ver novelas na televisão, enquanto Charlotte passa as noites com parceiros de ocasião. Um assalto, uma cama nova e umas cortinas brancas juntam estes dois seres, que acabam por construir a sua própria e atribulada história de amor. Uma das qualidades do cinema nórdico é a sua capacidade de se reinventar. Isto é, estes filmes são capazes de abordar assuntos diferentes, com uma nova perspectiva e, contudo, sem esquecer a memória do cinema. «Sexualidades» é um típico filme do contexto nórdico: imagem rude, câmara ao ombro e uma história marginal, ligada ao mais profundo da sociedade nórdica. A narrativa conta a história de Charlotte que resolve, depois de quatro anos de casamento, deixar o marido e ir viver para outra casa. É lá que, por acaso, encontra o seu novo vizinho, Ulrik. Contudo, Ulrik é agora conhecido por Veronica, já que quer mudar de sexo. Veste-se como uma mulher e usa uma peruca. Entre as duas mulheres vai nascer uma paixão improvável, que ambas tentam negar. Pelo meio aparece também o antigo companheiro de Charlotte, em plena crise existencial e vários homens que se prostituem com Veronica. Um caldo de relações sempre localizados no interior do prédios onde as duas protagonistas moram.

«Sexualidades» tem um sistema narrativo interessante: estrutura-se como uma telenovela (aliás, o título original do filme é mesmo o termo inglês para telenovela - “soap”) e, ao mesmo tempo, adopta mecanismos cinematográficos. Isto é, antes de cada sequência temporal do filme, um pequeno prelúdio, com uma voz off e imagens a preto-e-branco, num sistema de fotografias. Esse prelúdio resume o que aconteceu e lança motivos para continuar a ver o filme, porque alguma coisa irá acontecer. «Sexualidades» é um produto típico de uma cinematografia nórdica: personagens à beira de uma crise existencial e com muitas feridas escondidas debaixo da superfície. Uma das histórias paralelas da narrativa é a da mãe de Verónica/Ulrik: a mãe visita-a regularmente e, para além de a tratar sempre pelo nome que não quer (Ulrik), continua a esconder do pai (que, percebemos, renegou o filho). Como se pode ver, o filme pretende entranhar-se num contexto de uma sociedade fechada, capaz de empurrar para um lixo os desvios ao padrão. Veronica não cabe nos padrões. Nasceu homem mas quer ser mulher e esta decisão provoca um impacto demasiado forte nas pessoas que a envolvem.

Filme duro, por vezes quase hiper-realista. Mesmo que ainda não atinja os patamares das obras-primas resta uma história de um amor improvável, que me cativou (Se a mulher e o homem deixassem de ser definidos como criaturas de um só sexo, como é que seria o jogo do amor e do erotismo?).
A Soap - trailer

11 comments:

Ka said...

Quase não conheço o cinema nórdico mas parece-me um bom filme.

A questão posta é muito pertinente...mas de difícil resposta uma vez que a afectividade entre duas pessoas (que não apenas a amizade)está sempre associada ao erotismo e à sexualidade...

Anonymous said...

pergunta pertinente... não tenho resposta.
Vim só dizer OLÀ.

Maria P. said...

Como em todos os jogos, uns perdem outros ganham (ou pensam que ganham).

Um beijinho Luís.


P.S. foto 74(também)

Mar Arável said...

O AMOR NÃO TEM SEXO

Fernando Pinto said...

Este teu espaço é singular por oferecer uma pluralidade de assuntos, temas esses que me fascinam... Amo o cinema europeu! Obrigado pelo "post".

Abraço,
FM

Bernardo Kolbl said...

Bom fim de semana.

Espaços abertos.. said...

O amor não tem fronteiras nem idade,é como um jogo que ora se perde ora se ganhe.

Bom fim de semana
Bjs Zita

Anonymous said...

tenho ótimas lembranças dos filmes nórdicos que eu vi. quando este estrear por aqui no Brasil eu irei asssitir.
abraço

Rafaela said...

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•*´O dia mais desperdiçado de todos .•
*´`*é aquele no qual não demos .•*´
.•* *´´ um único sorriso. .•*
. .•*Então sorria muito e tenha um.... . .•
•* *´`´ Bom fim de semana!!!
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Chawca said...

Aguçou a curiosidade, agora é esperar chegar aqui no Brasil..

Anonymous said...

Encontrei, por acaso, este seu blogue e fiquei "perflexa" como dizia um amigo quando ficava mesmo perplexo.
Não imaginava ter privado de tão perto e tantos dias com alguém, afinal, tão desconhecido.
Memórias de Adriano,Virgínia, Truffaut, Bergman, Ne me quitte pas, Lorca, O meu primeiro beijo ( claro que prefiro nesse teu jeito cinzento de quem mói um pensamento)...
Um abraço!