
Ludwig Museum, Cologn)
3.ª feira. Jazz no agradável Jardim do Goethe-Institut. O Verão convida e o Instituto Alemão é um excelente destino: o Jazz im Goethe Garten estreou esta edição com o trompetista Gast Waltzing, compositor de mais de 150 bandas-sonoras. De formação clássica e fundador do ensino do jazz no Conservatório do Luxemburgo, concretiza a sua visão do jazz – eclética e eléctrica – condimentado com mundos diversos. Ouvir 60 minutos de música jazz ao final da tarde acreditem que garante uma boa noite de sono. 4.ª feira. Uma coreografia radiofónica no centro da cidade de Lisboa. O Teatro Ligna de Hamburgo, responsável por um programa original no âmbito da rádio interactiva, associou-se à Antena 2 apresentando uma narrativa em torno de episódios históricos representados ao vivo. O evento contou com a intervenção de duzentos participantes numa onda de bailado colectivo. A iniciativa “À Procura da Revolução Perdida” evocou o 25 de Abril e a euforia revolucionária, mas também a impetuosidade consumista. A narrativa foi conduzida pela actriz Carmen Dolores. Quem passou pela Rua Augusta, entre as 18.00 e as 19.00, levou seguramente algum tempo a perceber que o misterioso fenómeno que observavam não se tratava de um caso de transe colectivo. Um rádio com auscultador, para ouvir a voz de comando, uma máquina fotográfica, para guardar alguns instantes, uma esteira e uma flor. O resto era o desejo de ir "à procura da revolução perdida". O meu núcleo familiar restrito ali assentou arraiais e participou descontraído nesta encenação. 5.ª feira. Jorge de Sena. O poeta e ensaísta falecido há 30 anos foi celebrado no Teatro Nacional de S. Carlos, numa sessão organizada pela Fundação José Saramago e destinada a reavivar a memória e a obra de um grande autor quase esquecido. "Jorge de Sena não teve o reconhecimento que merecia e hoje em dia os seus livros são difíceis de encontrar nas livrarias", lembrou alguém. Perante uma audiência que encheu o Salão Nobre do TNSC, Saramago justificou a escolha de Sena para a sessão intitulada «Um Regresso»: «É um grande poeta, um grande escritor, uma grande cabeça e um grande coração». Além do Nobel português, foi bom escutar Eduardo Lourenço exercendo um profundo fascínio e sempre surpreendendo pela capacidade de ser portador de um olhar inquietante. O programa incluiu ainda um recital de António Rosado e a leitura de poemas por Jorge Vaz de Carvalho. Apetece-me pegar nas palavras de António Mega Ferreira, também presente: "Leiam-no e amem-no!"
Quanto de ti, Amor...
Quanto de ti, amor, me possuiu no abraço
em que de penetrar-te me senti perdido
no ter-te para sempre -
Quanto de ter-te me possui em tudo
o que eu deseje ou veja não pensando em ti
no abraço a que me entrego -
Quanto de entrega é como um rosto aberto,
sem olhos e sem boca, só expressão dorida
de quem é como a morte -
Quanto de morte recebi de ti,
na pura perda de possuir-te em vão
de amor que nos traiu -
Quanta traição existe em possuir-se a gente
sem conhecer que o corpo não conhece
mais que o sentir-se noutro -
Quanto sentir-te e me sentires não foi
senão o encontro eterno que nenhuma imagem
jamais separará -
Quanto de separados viveremos noutros
esse momento que nos mata para
quem não nos seja e só -
Quanto de solidão é este estar-se em tudo
como na ausência indestrutível que
nos faz ser um no outro -
Quanto de ser-se ou se não ser o outro
é para sempre a única certeza
que nos confina em vida -
Quanto de vida consumimos pura
no horror e na miséria de, possuindo, sermos
a terra que outros pisam -
Oh meu amor, de ti, por ti, e para ti,
recebo gratamente como se recebe
não a morte ou a vida, mas a descoberta
de nada haver onde um de nós não esteja.
Jorge de Sena
in Visão Perpétua
Quanto de ti, amor, me possuiu no abraço
em que de penetrar-te me senti perdido
no ter-te para sempre -
Quanto de ter-te me possui em tudo
o que eu deseje ou veja não pensando em ti
no abraço a que me entrego -
Quanto de entrega é como um rosto aberto,
sem olhos e sem boca, só expressão dorida
de quem é como a morte -
Quanto de morte recebi de ti,
na pura perda de possuir-te em vão
de amor que nos traiu -
Quanta traição existe em possuir-se a gente
sem conhecer que o corpo não conhece
mais que o sentir-se noutro -
Quanto sentir-te e me sentires não foi
senão o encontro eterno que nenhuma imagem
jamais separará -
Quanto de separados viveremos noutros
esse momento que nos mata para
quem não nos seja e só -
Quanto de solidão é este estar-se em tudo
como na ausência indestrutível que
nos faz ser um no outro -
Quanto de ser-se ou se não ser o outro
é para sempre a única certeza
que nos confina em vida -
Quanto de vida consumimos pura
no horror e na miséria de, possuindo, sermos
a terra que outros pisam -
Oh meu amor, de ti, por ti, e para ti,
recebo gratamente como se recebe
não a morte ou a vida, mas a descoberta
de nada haver onde um de nós não esteja.
Jorge de Sena
in Visão Perpétua
E assim a vida vai deslizando noite fora…