Thursday, August 02, 2007

o que eu era outrora já não se lembra de quem sou...

Meu pai
Que nos fizeste pai
que desuniste
não me lembro de ti
assim belo, meigo, triste
ai de mim!
que fizeste de nós
as três donzelas?
minha mãe era uma delas
minha irmã e eu
e José
o varão que morreu
passaste veloz
pela minha infância
breve paternidade
mas ficou-me um gosto
de pai
na minha tenra idade
e por isso ser mais forte
que o marido infiel
que o pai ausente
olho-te
e vejo o melhor de ti
o mais terno
o mais belo
o pai mais desejado
que pouco vi.

Fotopoesia é uma autobiografia caracterizada por um enorme carinho pelas pessoas. Cada fotografia de Isabel Ruth é acompanhada por um poema escrito pela própria. É um livro terno, onde acompanhamos a vida da actriz através da imagem e da palavra. É o livro de uma vida de afectos e de viagens, um livro de poemas escritos numa linguagem discursiva, directa e de comunicação enérgica. Mas uma obra que reflecte o seu mundo íntimo e que invoca de forma nostálgica uma postura e um tempo. Como bem escreve Urbano Tavares Rodrigues no prefácio, Isabel viaja pelo mundo e por almas, corpos, cidades embruxadas, Roma duradouramente, mas também Istambul, as mesquitas, o banho turco redentor, e pela Índia, lá e cá, pelo Nepal.
Uma estrada de memórias de meninice, a vida sentimental, os encontros com Carlos Drummond de Andrade e Vinícius de Morais, as muitas pessoas que se cruzaram com a mulher e com a actriz, o recordar os seus filmes e as vidas fictícias que assumiu intensamente …

Sou a 1ª pessoa
do meu verbo
a que vê
a que sente e reconhece
a que necessita do todo
para se ver
e nos outros
se vê a si somente
dou parte de fraca
tenho medo e recuo
o medo de existir
é tão feroz às vezes
que apelo a todo o meu sentir
o medo de ser
é tão atroz às vezes
que é preciso toda a voz
para se ouvir

tudo é tão veloz
breve passeio a sós
nesta centelha de existir.


Não é difícil sentir autêntica a epígrafe que Isabel Ruth escolheu para o livro:...o que eu era outrora já não se lembra de quem sou.

Recordar
cumprir esta vontade que se impõe
a que devo obedecer

beber da fonte
um jorro de prazer
um prazer diferente

soltam-se as palavras como notas
que se vão compondo

a cada um
a sua sinfonia

e o belo canto
vou decifrando
na pauta
por enquanto…
Isabel Ruth, actriz, bailarina. Formada na Royal Ballet School de Londres, foi bailarina do Ballet de Lisboa e do Grupo Experimental de Ballet. Estreou-se no cinema com um dos mais míticos filmes do cinema português, Os Verdes Anos, de Paulo Rocha. Filmaria depois com os realizadores, António Macedo ("Domingo à tarde"), João Botelho (“Conversa acabada"), Manoel de Oliveira ("O principio da incerteza"), Fernando Lopes ("O Delfim"), José Álvaro Morais ("Peixe Lua"), Teresa Villaverde ("A Idade Maior", "Três Irmãos", "Os Mutantes") entre outros. É dirigida por Pasolini em Edipo Rei. No teatro, estreou-se com O Marinheiro, de Fernando Pessoa. Trabalhou, entre outros, com Luís Miguel Cintra. Em 1999 a Cinemateca Portuguesa fez-lhe uma homenagem e João Bénard da Costa dedica-lhe o livro A dupla vida de Isabel Ruth.
Ler artigo sobre Isabel Ruth e a dança em
Revista de Dança.

28 comments:

Ka said...

Luís,

As coisas que nos mostras...lá vai mais um para eu comprar!

Pelo que li neste teu post, ela tem uma sensibilidade e um poder para pôr em palavras as lembranças, os sentimentos...coisas que não é fácil.
Fiquei curiosa pelo livro

Beijinho e bom fim-de-semana

Ps - Não sei por quê mas acho que a frase da capa do livro "o que eu era outrora já não se lembra de quem sou" tem muito a ver contigo...

avelaneiraflorida said...

ADMIRO MUITO ESTA SENHORA!!!!!
Sempre a achei uma actriz de excepção!!!!

Não conhecia o livro..."brigados" pela pista!!!!

Lá vai o orçamento...

avelaneiraflorida said...

ADMIRO MUITO ESTA SENHORA!!!!!
Sempre a achei uma actriz de excepção!!!!

Não conhecia o livro..."brigados" pela pista!!!!

Lá vai o orçamento...

Jonice said...

Este livro parece imprescindível.
Beijinhos, Luís.

Frioleiras said...

Não vou responder ao teu blog, peço desculpa por isso, mas sim ao q tu comentaste no meu sobre o MNAA.... Tb lá estive na inauguração, (... tal como praticamente lá estou tds os dias...) adoro aquele museu, vivo quase para aquele museu e... a Dalila deu-lhe carisma, juventude e limpou as teias de aranha que havia pelos cantos... Mts vezes com dificuldade porque o feitio impulsivo dela se tornava muitas vezes contudente mas creio que a maior vítima era ele própria. Admirei-a , admiro-a, mt.
Muitas vezes sentia que não havia mt gente com paciência para os rápidos e súbitos "caprichos" dela, tantas vezes inopturnos mas.... sem isso a obra que ela fez em apenas 2 anos não teria sido possível ! Vou ter imensa saudade do brilho que ela deixava , quando atravessava, decidida, os corredores daquele museu...

Lúcia Laborda said...

Infelizmente não tive o prazer de conhecer a obra. Mas pela amostra que vi, por aqui aguçou-me a vontade. Bom fim de semana! Fique com Deus!
Bjs

Suspiros said...

Cada pessoa é potencialmente um infinito pessoal. Esta é uma delas!
Os seus posts são (sempre)muito o interessantes!!! Palavra!
:)

Kalinka said...

Muito obrigado pela partilha. Não conhecia.

Pelos meus lados, irei começar uma foto-reportagem das minhas férias no Canadá. Cheguei dia 1 de Agosto...ainda estou cansada, em fase de recuperação...logo que possa darei início às revelações.

No Verão de 1907 acampou em Brownsea um grupo de rapazes e viveram uma inesquecível aventura.
AH...já descobriu agora, porque existe em mim, este ESPÍRITO AVENTUREIRO...???

Beijokas.

BOAS FÉRIAS.

Sheherazade said...

Luís,
Esse poema sobre o pai é simplesmente arrasador! Graças a Deus não foi o meu caso, mas aqui, no Brasil, conheço inúmeras pessoas que nunca viram seus pais, que as abandonaram ainda em tenra idade e as identifiquei, de pronto, nas entrelinhas dessa maravilhosa obra.
Parabéns!

João Roque said...

Caro Luís
eu recordo-me da Isabel Ruth, nos tempos dos "Verdes anos" quando ao som daquela música do carlos Paredes calcorreava Lisboa, aos domingos, namorando. Suponho, não estou certo, que foi casada com o João d'Àvila, e com ele abriu um pequeno bar na 5 de Outubro.
Hoje é uma Senhora actriz, que não tem medo de mostrar a sua bela velice, e que escreve divinamente.
Que dure muitos anos mais.

Anonymous said...

Só a conhecia como actriz, não a sabia poeta também! Mas gostei muito da escrita dela. É um caso a investigar, obrigado por mais este bocado de conhecimento que aqui partilhas.

abraço

Fernando Pinto said...

Uma actriz de sonho para qualquer cineasta europeu!

Abraço do FMOP

Maria said...

Isabel Ruth - uma actriz de excepção.
Vi-a no Verdes Anos, e nos filmes que se seguiram...
Obrigada por a trazeres aqui, à net.

Beijo

Elsa Sequeira said...

Deixei-te um abraço no meu cantinho!!

BEIJINHOS

OLHAR VAGABUNDO said...

OBRIGADO POR ME TERES ABERTO ESTA JANELA, POIS FIQUEI A ADORAR A TUA SUGESTÃO...
ABRAÇO VAGABUNDO

Lúcia Laborda said...

Passando pra deixar um beijo e desejar que sua semana seja maravilhosa! Fique com Deus!

ninguém said...

q lindo luis
O silêncio é de ouro em muitas ocasiões. Qd, p ex, se tem ym punho fraturado dps de um segundo tombo em 5 dias e tendinite bo braço direito.É. Catar milho é difícil pra acompanhar as idéias, mesmo as + confusas.
Deixo este texto até poder voltar.
Pensen positivo, to precisando

Alexandre said...

Uma personalidade e um charme difíceis de encontrar, sempre achei a Isabel Ruth uma actriz de primeira água, capaz de encarnar os clássicos e protagonizar o moderno.

Um abraço!!!

Luma Rosa said...

Linda mostragem! Gostaria de poder adquirir um exemplar do livro, verei se pela internet posso encomendar. Acho que não tem publicação brasileira, não é?
A atriz muito já ouvi falar. Primorosa em seus trabalhos.
Beijus

teresamaremar said...

Olá

conhecia-a enquanto actriz, não as palavras escritas

"o que eu era outrora já não se lembra de quem sou"... a dizer aquilo que sentimos de um modo que não nos lembrariamos. A ler.

Boa semana

Kalinka said...

Que é feito de TI...???
Uma ausência...será férias?

A minha alma está vazia,
o meu coração muito triste,
deixo-te uma poesia
da querida Sophia.

A hora da partida soa quando
Escurece o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.
A hora da partida soa quando
as árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.
Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.

Beijitos.

GarçaReal said...

Deve ser digna de ser lida esta fotobiografia...Muito interessante.
Vi alguns dos seus filmes.

bjgrande

Ana Paula Sena said...

Parece ser bem interessante! Agradeço a divulgação. Talvez não desse toda a atenção merecida ao livro. À actriz, obviamente que sim!

P.S. - Vinha também dizer que fiz uma sugestão ao Infinito Pessoal, lá no meu blog, acerca dos 10 filmes preferidos. Entretanto, reparei que já respondeu. :) Gostei de tomar nota das óptimas escolhas aqui assinaladas.
Agradeço também as visitas ao Música do Acaso. :)

Maria Eduarda Colares said...

como sempre um lugar indispensável de visitar, este infinito (em sugestões boas) pessoal (mas muito transmissível).
Beijos

Lúcia Laborda said...

Passando pra deixar beijinhos.
Bom fim de semana!

Vieira Calado said...

Quem não se lembra desta velha senhora, esta extraordinária actriz!

Frioleiras said...

O que eu aprendo contigo... com este teu blog !
Obrigada, Luís !

take.it.isa said...

Só conhecia o lado de actriz!

Não me espanta saber que as palavras desta senhora têm uma tal sensibilidade.

Boas férias Luís. Um abraço