(Jorge Molder, Nox)
O coração agitado batia como um louco num tambor, tão carregado de desejo. Deitei-me mas de olhos bem abertos. Não demorei a verificar que se entranhavam dentro do quarto daquele hotel de abstinência uns ténues reflexos, como se trouxessem notícias de algures. Soergui-me e olhei para a janela. Tempestade – suspeitei –, naquele Outono, em finais de Setembro; mas distante, pois nem se ouviam os trovões, somente se iluminavam no céu e a cada instante: não só se acendiam como tremiam como a asa de um pássaro semimorto. Levantei-me, fui ao terraço e lá fiquei até de manhã, imóvel, de vigia…Os relâmpagos rodopiavam como fantasmas em delírio, não paravam um momento que fosse, como se tudo, os sinais do horizonte e do céu, fosse retocado a aguarela. Contemplava a ilha silenciosa, a encenação pardacenta do jardim, as frontarias enrugadas dos edifícios que igualmente pareciam estremecer a cada frágil lampejo…Olhava com tão profundo sentimento e não conseguia desviar os olhos – aqueles clarões pareciam harmonizar-se com os impulsos calados e intensos que se incendiavam por mim. Rompia o dia, a madrugada assomava em manchas vermelhas. Com o nascer do sol os relâmpagos iam desmaiando, consumidos pela luz do novo dia…
Mas os relâmpagos dentro de mim teimavam em permanecer; a imagem de Margarida, continuava, triunfante, sobre a minha alma, como se dançasse ao som de um violino. Só que também ela, a imagem, parecia querer voar: como um cisne branco que, ao esvoaçar, se aparta do pântano. E eu, ao adormecer, com as lágrimas banhando-me o rosto, suspirando na cama, abracei-a com a sensação de despedida…
O primeiro amor. Nem um murmúrio, nem um pensamento, nem o olhar, nem o beijo hei-de algum dia esquecer.
Onde estás agora? Onde estás, Margarida?
Luís Galego
Mas os relâmpagos dentro de mim teimavam em permanecer; a imagem de Margarida, continuava, triunfante, sobre a minha alma, como se dançasse ao som de um violino. Só que também ela, a imagem, parecia querer voar: como um cisne branco que, ao esvoaçar, se aparta do pântano. E eu, ao adormecer, com as lágrimas banhando-me o rosto, suspirando na cama, abracei-a com a sensação de despedida…
O primeiro amor. Nem um murmúrio, nem um pensamento, nem o olhar, nem o beijo hei-de algum dia esquecer.
Onde estás agora? Onde estás, Margarida?
Luís Galego
14 comments:
Como sempre, amigo Luís, um texto extremamente bem escrito e delineado; não sei porquê, talvez pela descrição da tempestade nocturna, parecia estar a assistir a uma cena do "Monte dos Vendavais"...
Abraço amigo.
"Quando da minha noite" te leio, emociono-me às lágrimas!
Sem mais palavras...!
Um grande abraço.
Caro Dr.e ilustre amigo:por que não assumir ,com gosto, o seu contacto comigo?Obrigada por perder um pouco do seu-imagino!-precioso tempo, comigo.
Vou responder-lhe ,de modo especial, no meu blog...Acho que isso não deve ser só nosso, essa cumplicidade na escrita. Portugal precisa de escritores do seu teor!
Eu amo a poesia que leio e que escrevo...mesmo que ninguém a publique!Confio que, um destes dias, sem o Dr contar, a responsabilidade de uma publicação lhe bata à porta...
Abraço amigo
Vale a pena esperar uma semana entre cada texto do infinito.
Lembrei-me do meu primeiro amor, aquele que ainda há cheiros que o conseguem evocar.
Agradeço o facto de partilhar connosco este seu fantástico talento!
Escreves tão bem luís...
quanto ao texto, há amortes assim que não sevesquecem, a vida continua, mas cada pormenor fica para sempre entranhado em nós.
bom fim de semana.
"(...) a imagem de Margarida, continuava, triunfante, sobre a minha alma, como se dançasse ao som de um violino. (...)O primeiro amor. Nem um murmúrio, nem um pensamento, nem o olhar, nem o beijo hei-de algum dia esquecer."
Sabes, Luis, penso que já o disse, que a tua ficção aos pedaços, embora nos deleite (e muito) nao seria impeditiva de um romance. A tua escrita é, de facto, cativante.
Aquele abraço
Onde estás agora? Onde estás, Margarida?
Todas as Margaridas
existem
na asa que voa
Delicioso texto como sempre
Excelente.
Beijinho*
Dizem que quando começamos a recordar, é sinal de que estamos velhos.
Nada mais falso.
É sinal sim, que a nossa capacidade de amar se encontra proporcional à idade.
Saudações.
Muito bom texto, aliás tu escreves muito bem!
abraço
Se te leio quase sempre em silêncio e sem deixar rasto, porque abri a caixa de comentários se tão pouco posso dizer?
É mais um belíssimo texto teu...
Obrigada, Luís.
Um beijo
Margarida continua connosco, até o fim, até nós darmos por isso que o amor, após tanta procura, era apenas isso...
:-)
Luis,
Hoje venho desejar-te uma Páscoa Feliz, com muita Luz e muito Amor que irradiem por todos os dias da tua vida.
Um abraço Amigo,
Maria Faia
Caro amigo,
As palavras que deixaste no meu cantinho e ditas por um escritor de grande qualidade como es tocaram-me imenso.
Posso confidenciar-te que do meu primeiro amor(zinho), poucas lembranças tenho mas do meu grande amor, tenho a felicidade de continuar a amá-lo e ser amada por ele desde há 38 anos !
Tendo deixado os meus votos no meu último post, principalmente a todos os que me visitaram durante o meu "retiro", não quis deixar de vir desejar-te pessoalmente uma Páscoa Feliz !
Beijinhos da
Verdinha
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