Imagem retirada daqui
Votaria em Charles Baudelaire, se tal fosse possível. Tal como o sábio das emoções advogava também acho que se deve andar sempre embriagado; bebedeira o grande archote de qualquer teoria de ciência politica, o mote de um credível programa eleitoral. Não posso tolerar sentir o hediondo incómodo da melancolia que me rasga o corpo e a alma e me transporta para a nostalgia, não aguento representar um papel decadente para uma plateia vazia, devo cavalgar por cima das nuvens negras e embriagar-me sem cessar. Com um simples Cabernet Sauvignon de supermercado, com as palavras dos poetas, com um verso cintilante, com uma música antiga da Provença e da Toscana ou com o cheiro do jasmim, o que seja. Mas há que embriagar-me. Há que sentir no ar que respiro a fragrância do mais agradável perfume, há que afundar na beleza do instante que passa, há que jogar incessantemente na roleta da festa e do prazer, há que ouvir a melodia secreta da paixão, há que chorar de alegria junto ao mar, há que embriagar no meio de uns braços quentes, há que encostar o ouvido à página do livro mais belo, há que amar num entardecer em Roma, há que gritar bem alto que sou feliz, há que utilizar o chicote sobre a tristeza e a aflição. Na imensidão da noite, nos degraus de um teatro, no banco de trás de um eléctrico solitário, no vazio de um quarto de hospital, no mais recôndito recanto, ao despertar com a embriaguez já atenuada, lembrar-me-ei sempre do Spleen de Paris:
“São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto, mas por favor embriaga-te”. Claro que votaria em Baudelaire…
Luís Galego
“São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto, mas por favor embriaga-te”. Claro que votaria em Baudelaire…
Luís Galego
25 comments:
E porque não?
Bjs
Nele também acreditaria, se possível fôr, Baudelaire nosso que tas nos céus...
Abraços cordiais
"...embriaga-te, embriaga-te sem cessar!"
Ele próprio escreveu:
"O homem que só bebe água tem algum segredo que pretende ocultar dos seus semelhantes"
Fiquei, digamos que embriagada do prazer de ler este texto.
...............
excelente.
Reflexão para uma votação anunciada?
Eu também!
M&S
É pena que por vezes apenas a embriaguez nos conduza à felicidade, embora a embriaguez que aqui expressas seja tão cheia de beleza...
Abraço.
Vamos a isso, também quero fazer parte desse projecto político!
Belo texto, fina e subtil ironia.
Ah Baudelaire, Baudelaire!
"Cantava a alma do vinho à tarde nas botelhas:'Homem, eu ergo a ti,
ó deserdado e triste, de minha prisão vítrea e de ceras vermelhas,
um canto fraternal que só de luz
consiste!'..."
Também votaria em Baudelaire se entre nós ainda estivesse, mas como
temos Luís Galego lucidamente embriagado, meu voto é todo teu!
Um grande abraço embriagado de poesia!
É emblemático esse texto de baudelaire, em que faz a apologia da embriaguês, como Metáfora do esquecimento dos problemas da vida. O nosso CESÁRIO "bebeu" alguma inspiração no grande parnasiano francês, mas como sabes, servindo-se dos sentidos, foram sobretudo as realidades vividas, cheiradas, tocadas e sentidas que o nosso realista- parnasianista mais desenvolveu, socorrendo-se de SINESTESIAS belíssimas...
BEIJO DE LUSIBERO
É verdade que a embriaguez é uma fuga, mas quanta ânsia de fugir desta realidade nós encerramos dentro do nosso espírito? Como o texto é inebriante, eu voto no seu autor na falta de baudelaire.
Caro amigo Luís,
Gostava de te dizer que estou com uma grande bebedeira nos cornos. Mas sei que iria alcoolizar a escrita e as palavras podiam sair tremidas. O melhor mesmo é dizer que estou embriagado. Um termo com melhor compreensão nos círculos sociais de "gente fina" e talvez mais aceitável no quadro de uma literatura de boa graduação. E nem vou entrar em pormenores sobre o estado em que me encontro… cagado e mijado. Desculpa… deslustrado e humedecido! Sempre esta queda para a brejeirice no falar de situações delicadas de um homem decomposto com avinho. Agrada-me Baudelaire na sua eloquente exortação a andar embriagado. No entanto, para mim, o Vasco continua a ser o modelo por excelência da saudável e alegre embriaguez, com aquele dom incomparável de se fazer entender até por um candeeiro de rua, unicamente possível a um verdadeiro embriagado na genuína tradição portuguesa. Quantos baudelaires pensaram alguma vez que um candeeiro da via pública os conduziria a casa! Este modelo, com tinto ou branco, mostra à saciedade que podemos ser escravos mas não martirizados, embriagados mas não perdidos. À imagem e semelhança do Vasco, bem sabemos que com o vinho também vem a poesia e a virtude, às vezes num português estafado, outras vezes com erudição - «in vino veritas.»
Parafraseando o meu caro amigo,
é claro que votaria em Vasco, se tal fosse possível.
Permite-me um abraço,
com o hálito da melhor casta da nossa patriótica viticultura,
Thiago M.
Nota 1 – Será do meu estado de graduação elevado ou é mesmo verdade que o teu texto foi publicado em letras cor de vinho? [arroto]
Nota 2 - Dado o carácter entornado destas minhas palavras, publicá-las aqui talvez seja demasiada ousadia. Nem toda a gente suporta um gajo pingado!
Ser apenas um embriagado, um humilde andarilho das emoções, munido de um bom par de olhos, um grande ouvido e um caderno em que anotar o particípio passado, e um canivete a raspar essas velhas inscrições burguesas, devotar-se a perfeição das curvas em uma frase para onde quer que ela levasse, para desertos, para as colinas de areia, para dentro de si onde mergulhar uma lágrima.
bjs.
Aguardo a sua lista de candidatos
Entretanto
ergo-lhe o meu copo
que despejarei
obviamente
na urna
Caro Luís,
nem só de vinho vive o homem... os deuses sempre preferiram ambrosia.
mas a vida tem de nos embriagar! Se ela não o fizer...onde poderão caber todos os sonhos?
Um brinde a Baudelaire!
A beleza do texto, de facto, embriaga. No entanto, acho tão triste que se misture a doce embrieguez da arte com a pérfida embrieguez dessas coisas abjectas a que chamam bebidas alcoólicas! As letras bem combinadas de Baudelaire produzem arte como as pinceladas de Salvador Dali. Ou como o cinzel de Miguel Ângelo no mármore da bela Itália.
Talvez seja limitação minha mas não consigo misturar estas glórias imortais com uma estúpida garrafa de vinho tinto.
Baudelaire e o Luís Galego que mee perdoem.
Mus arrotos te ouvem, intensa nostalgia. não pare... não pare...
Brindar a intensidade... sempre... sempre... tudo que é (im)pulso e (des)encontro deseja vida, deseja festa... deseja sobretudo a fala dos emudecidos: arrote bem alto, e não pare, não pare...
Abraços sinceros dos meus braços transatlânticos.
«Qualquer homenagem é deliciosa para um artista, e torna-se-lhe duplamente agradável se lhe é dedicada pela juventude» (O.Wilde).
Hoje, quero brindar às imortais glórias dos mortais artistas com um simples Cabernet Sauvignon de supermercado, nesta minha irreverente juventude embriagada.
Os enólogos que me perdoem!
Soltou-se das mãos que a seguravam, partiu-se e com ela ficou derramado por terra morto o seu precioso tesouro. Aconteceu depois que alguém lhe chamou «estúpida garrafa de vinho tinto». A uma garrafa destas nunca se deve chamar «estúpida» porque o prometido é de vidro e a promessa é a de ser a honrosa guardiã de um “espírito” que a muitos dá sabor à existência, com temperança e moderação. Despedaçada na sua dignidade, arrastou consigo essa “espiritualidade” que alegra o coração e não menos a inteligência, e se prolonga com sobriedade e comedimento em obras para radicar, antes de tudo, na verdade - «in vino veritas».
A quem coube, por insondável desígnio, o desabrido acto de ofender uma «garrafa de vinho tinto», há-de pesar, certamente, uma consciência tão pecaminosa como a dos ébrios que desperdiçam por excesso o que lhes é dado a saborear com modéstia.
Do Olímpico Lagar, possa Baco, na sua magnânima indulgência, comutar o castigo pelo perdão para o ofendedor, de tal modo que este entenda o benefício de um tal “espírito” – no tinto ou no branco, sem discriminação – que não tolhe os conteúdos de verdade e de vida aos quais se chega, não só atraídos pelas letras bem combinadas, ou pinceladas e cinzeladas, mas também impulsionados e convidados por esse spiritus magnanimus.
Dixi!
Há coisas que só se aguentam com a companhia de um bom copo de vinho tinto. Nada substitui um "Quinta do Carmo": o mundo torna-se um lugar aprazível e Baudelaire o eleito. Também votaria neste candidato e brindaria a vitória da liberdade, da poesia, da beleza.
Mas bêbedos andamos nós neste mundo louco e corrupto. Embriagados de medo, de cansaço, de tristeza, de desilusão...
Para já brindo à continuação de muita inspiração... tim tim
Se Baudelaire fosse candidato
teria o meu voto
mesmo antes da abertura das urnas
e assim ganharíamos as eleições
todas as eleições
Abraço
Baudelaire, Toscana e Jasmim...
adorei o seu post, tem o meu voto!
Abraço
Chris
Manuel Cardoso, um bom vinho não se bebe, saboreia-se, como a arte...
Já experimentou?
Já, Cleópatra. Embora eu seja mais "coca-cola", nada tenho contra. Mas... quem saboreia embebeda-se? É que Baudelaire não fala em saborear mas em beber até cair, não é?
meu caro amigo, eu votaria sempre em baudelaire. ou então, em whitman, o "embriagado" de vida.
embriaguemo-nos, pois, de vida.
grande abraço
jorge vicente
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