Monday, November 27, 2006

em todas as ruas te encontro, Cesariny...

Mário Cesariny o último representante da plêiade de grande poetas portugueses que marcaram o século XX, juntamente com Herberto Hélder foi também uma figura de proa do surrealismo, movimento que em Portugal teve características especiais, e foi dos primeiros a dar todo o seu peso à obra de Fernando Pessoa. Um dos primeiros e mais celebrados livros de Cesariny chama-se, aliás, «Louvor e Simplificação de Álvaro de Campos».

«Sou um homem/um poeta/uma máquina de passar vidro colorido/um copo uma pedra/uma pedra configurada/um avião que sobe levando-te nos seus braços/(...)»

Quanto à morte, o poeta-pintor surrealista «gostava de ter daquelas mortes boas... a gente deita-se para dormir e nunca mais acorda (...).» Do amor, diz «(...) nunca acreditei muito na chamada alma gémea... Nesse aspecto eu era talvez um pouco à grega, alguém jovem, talvez, alguém mais inocente, alguém que tivesse a pureza do mar, a pureza e a tempestade, às vezes.» O capítulo da vida vem das raízes (em Espanha e na Córsega francesa) às memórias de família, amizades e inimizades, Lisboa desaparecida, experiência (homos)sexual, perseguição policial, Paris, Londres. Ao desinteresse pelo Saudosismo «como escola, como filosofia», contrapõem-se «saudades de voar». Um retrato multifacetado. Cesariny morreu ontem em Lisboa, com 83 anos.
Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco
conheço tão bem o teu corpo
sonhei tanto a tua figura
que é de olhos fechados que eu ando
a limitar a tua altura
e bebo a água e sorvo o ar
que te atravessou a cintura
tanto tão perto tão real
que o meu corpo se transfigura
e toca o seu próprio elemento
num corpo que já não é seu
num rio que desapareceu
onde um braço teu me procura

Em todas as ruas te encontro
em todas as ruas te perco

Mário Cesariny

12 comments:

silvia said...

O poema é lindo, quando amamos, até de olhos fechados somos capazes de reconhecer a pessoa amada...
Beijos e boa semana:)

Som do Silêncio said...

Bonita homenagem!

Beijo

Maria P. said...

A Casa de Maio hoje também "pensou" Cesariny.

Boa noite.

Tino said...

Quando se vive bem, vive-se sempre...o homem foi mas ficou a obra :)

Um abraço e boa semana! :)

Luís said...

uma homenagem merecida... tão merecida...

silvia said...

Passei pata dar um beijo de boa tarde:)

OLHAR VAGABUNDO said...

linda homenagem e escolha do poema,pois é o meu favorito dele e qtalvez dos que mais goste...
abraço vagabundo

mnemosyne said...

A sede é infinita...a procura é uma constante.
Belíssimo este poema!

Anonymous said...

Dele e em homenagem a ele:

"Ama como a estrada começa ..."

e, agora depois de te ler ...

"alguém que tivesse a pureza do mar, a pureza e a tempestade, às vezes.»

Sou "Cesarina" então... isso é o que fascina nas pessoas...

Não conhecia esta frase ...

A Cesariny o meu até sempre ...

A ti, um até já ...
Bjs Mel

Anonymous said...

por onde tens andado?
esperamos novas
MJCORREIA

Anonymous said...

por onde tens andado?
esperamos novas
MJCORREIA

Anonymous said...

Este poema de Cesariny assenta-me que nem uma luva. E faz-me lembrar um pensamento de Goethe que diz :

"Conhecer alguém aqui e ali que pensa e sente como nós, e que embora distante, está perto em espírito, eis o que faz da Terra um jardim habitado."

Mesmo quando distantes fisicamente as pessoas estão connosco, dentro do nosso coração e passam a fazer parte de nós!

P.N.