Bem, eu liberto-me como posso. Aquele conto da Viagem, escrevi-o para me libertar de uma certa sensação de morte e de perca, e de desaparecimento, e aí foi bastante catártico.
Sophia de Mello B. Andresen
Sophia de Mello B. Andresen
Ontem à tardinha, à hora dos mágicos cansaços como escreveu Florbela, fui ao Jardim de Inverno – gosto particularmente desta designação – do Teatro São Luiz assistir a um recital por Beatriz Batarda, com música original de Bernardo Sassetti, numa colaboração com o Festival Sete Sóis, Sete Luas. Este domingo foi a vez da actriz interpretar uma versão musicada do conto "A Viagem", de Sophia de Mello Breyner Andresen. O “Jardim” estava a abarrotar embora muitas das caras não me fossem desconhecidas; em frente à minha mesa onde me deliciava com um generoso balleys e escutava as palavras de Sophia, a voz de Beatriz e a música de Sassetti, Jorge Salavisa coordenava com o olhar a sala daquele teatro lisboeta de que é director. Foi uma sensação agradável confundir-me com toda aquela atmosfera envolta nas palavras enigmáticas da grande senhora da poesia portuguesa. Sem sombra de dúvida, um dos maiores poetas portugueses contemporâneos – um nome que se transformou, em sinónimo de Poesia e de musa da própria poesia.
O conto “A Viagem” configura-se como uma alegoria da vida humana e do modo como as pessoas têm de escolher um caminho, ou melhor, como têm de FAZER elas próprias o seu caminho. Através de uma belíssima alegoria Sophia apresenta-nos todos estes problemas no seu conto. Nele um casal que vai numa estrada é constantemente confrontado com o desaparecimento dos caminhos. Ambos pedem indicações e ajudas mas essas pessoas também desaparecem. Os dois pensam que se enganaram, voltam atrás, tornam a avançar por outros caminhos. Até que chegam a um abismo — simbolicamente o fim da viagem e, portanto, a morte. O homem cai e pouco depois também a mulher irá cair no precipício. Mas, mesmo nesta situação limite a mulher pensa:
— Do outro lado do abismo está com certeza alguém.
E começou a chamar.
Dois temas dominantes se digladiam neste conto: o absurdo e a esperança. No final, vence claramente a esperança. Deste modo, este conto contém uma lição sobre como lidar com o ABSURDO da vida: pressupõe a atitude do crente, de quem acredita que existe alguém depois da morte, mas também demonstra aquilo que Sarte dizia: “não é necessário ter esperanças para fazer”, para criar.
Mesmo perante a falta de sentido com que a vida muitas vezes nos galanteia, o homem tem de inventar a si próprio, tem de criar o seu caminho – tem de inventar o amor porque não há amor já feito.
Tudo isto ao fim da tarde num teatro sito no Chiado, um dos lugares que ainda me faz gostar de Lisboa.
O conto “A Viagem” configura-se como uma alegoria da vida humana e do modo como as pessoas têm de escolher um caminho, ou melhor, como têm de FAZER elas próprias o seu caminho. Através de uma belíssima alegoria Sophia apresenta-nos todos estes problemas no seu conto. Nele um casal que vai numa estrada é constantemente confrontado com o desaparecimento dos caminhos. Ambos pedem indicações e ajudas mas essas pessoas também desaparecem. Os dois pensam que se enganaram, voltam atrás, tornam a avançar por outros caminhos. Até que chegam a um abismo — simbolicamente o fim da viagem e, portanto, a morte. O homem cai e pouco depois também a mulher irá cair no precipício. Mas, mesmo nesta situação limite a mulher pensa:
— Do outro lado do abismo está com certeza alguém.
E começou a chamar.
Dois temas dominantes se digladiam neste conto: o absurdo e a esperança. No final, vence claramente a esperança. Deste modo, este conto contém uma lição sobre como lidar com o ABSURDO da vida: pressupõe a atitude do crente, de quem acredita que existe alguém depois da morte, mas também demonstra aquilo que Sarte dizia: “não é necessário ter esperanças para fazer”, para criar.
Mesmo perante a falta de sentido com que a vida muitas vezes nos galanteia, o homem tem de inventar a si próprio, tem de criar o seu caminho – tem de inventar o amor porque não há amor já feito.
Tudo isto ao fim da tarde num teatro sito no Chiado, um dos lugares que ainda me faz gostar de Lisboa.
16 comments:
Olha a minha Tia!!! Bom dia, boa semana,
Beijo
A poesia é um bálsamo! Acompanhada de música, pode ser o seu perfume... beijos
boa semana!
Ainda é bom gostar de Lisboa. Eu gosto.
Boa noite*
Luiz, a frase " Mesmo perante a falta de sentido com que a vida muitas vezes nos galanteia, o homem tem de inventar a si próprio, tem de criar o seu caminho – tem de inventar o amor porque não há amor já feito." arremata com competência e resume a ideia do texto.
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E viva a arte, bom modo de nos inventarmos a nós próprios, de criar caminhos, de revelar-amar.
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Abraço pernambucano.
Muito bom programa, queria ter estado lá também.
Adorei este trecho de teu post, Luis.
Mesmo perante a falta de sentido com que a vida muitas vezes nos galanteia, o homem tem de inventar a si próprio, tem de criar o seu caminho – tem de inventar o amor porque não há amor já feito.
É isso, não há amor já feito, não há caminho se não trocarmos os passos ... enfim ... não há vida vivida.
Beijinhos :)
Fiquei conmovido pelas tuas palavras e pela simbologia do conto de Sophia de Mello. Uma das escritodas portuguesas que ainda não conheço bem, mas da que sempre tive referências muito boas. Se calhar tu podes me ajudar a escolher coisas dela para començar a conhecé-la.
Obrigado... deixas mesmo o estremecimento do abismo na minha pele...
Beijo.
Uma vez mais, uma conjugação astral fabulosa.
Que posso eu dizer, para além de que, ainda bem que existem blogs de pessoas que nos remetem para o palco das artes, que nos recordam a cada momento a importância de alimentarmos a Alma para que ela nos alimente a Vida?
Luís, um bem hajas!
Ai, que saudades de Lisboa!!!!!!!
"Mesmo perante a falta de sentido com que a vida muitas vezes nos galanteia, o homem tem de inventar a si próprio, tem de criar o seu caminho – tem de inventar o amor porque não há amor já feito."
Um grande abraço, do lado de cá do oceano
Foi uma hora de mágicos cansaços num lugar mágico, pelos vistos ;)
Também gosto mutio de me perder por esses lados...
Tua e minha PR! Ora boa noite então. Gostei de ler.
" Mesmo perante a falta de sentido com que a vida muitas vezes nos galanteia, o homem tem de inventar a si próprio, tem de criar o seu caminho – tem de inventar o amor porque não há amor já feito. "
Uma frase muito bonita. No entanto será que num mundo sem sentido, sem uma lei trancendental, os valores ético-morais humanistas poderão prevalecer? Interessante também seria saber-se a que tipo de amor aqui se refere. O amor em sentido restrito, entre duas pessoas ? ou o amor entre todos os homens de que fala, por exemplo, o Cristianismo?
E será que o amor e o respeito mútuo entre os homens Existe de verdade? Tudo nos leva a pensar o contrário. Basta abrirmos a janela e olharmos para a rua.
Um mundo baseado no amor era o desejável, mas será isso possível? todos os factos históricos nos levam a crer que não.
Perfeito!
O S. Luiz, Beatriz Batarda, Sophia de Mello Breyner... o Chiado ao fim da tarde... um pequeno paraíso que deveríamos oferecer a nós próprios regularmente! Pena que esta vida de correrias por vezes não nos deixe tempo para fazer isso mais vezes!
Um abraço!!!!
Olá Luís, obrigado pela visita. Gostei muito deste blogue, encontrei aqui duas das minhas maiores paixões; poesia e cinema. Deliciei-me a olhar para aquele desfilar de cartazes. Um abraço.
"Inventar o amor". Coisa dificil.
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