Thursday, June 21, 2007

erro sociológico, diz ele...

Fernando Lopes, cineasta da geração de realizadores que desponta para o cinema através do movimento cineclubista, para muitos o maior cineasta de Lisboa de todos os tempos, adquire os primeiros saberes cinematográficos graças à televisão – ingressou na RTP no ano de inauguração, 1957, de cujo canal 2 viria ser fundador. Diploma-se pela London Film School e após o regresso a Portugal, assina Belarmino (1964), filme documentário sobre a vida do boxeur Belarmino Fragoso, considerado uma obra-chave do movimento do novo cinema português. Em 1965 faz um estágio em Hollywood e ao voltar filma Uma Abelha na Chuva (1971), adaptando o romance de Carlos de Oliveira que seria protagonizado pela actriz Laura Soveral. Realizou ainda Nós Por Cá Todos Bem (1976), Crónica dos Bons Malandros (1983), Matar Saudades (1988), O Fio do Horizonte (1993), baseado no livro de António Tabucchi, e O Delfim (2002), adaptado do livro homónimo de Cardoso Pires. Lá Fora (2004) e 98 Octanas (2006) são os seus mais recentes filmes.

Este resumo a propósito da interessante autobiografia oferecida pelo realizador ao último JL. Aqui deixo excerto que me desconcertou pela beleza e franqueza das palavras:

Bebi demais (não me arrependo)
Fumo demais (não me arrependo)
Comovo-me demais (não me arrependo)
Sou um erro sociológico
Estou onde não devia estar,
Sou aquilo que não estava previsto que eu fosse.
Desígnios de Deus?
Essa questão está para mim (quase) resolvida.
Como disse Queneau: “Deus, por pudor, não existe”.
Ou, se existe, Deus é cego, surdo e mudo. Vai
dar ao mesmo.
Aviso: o abaixo assinado têm código de barras.
Numa leitura electrónica está lá tudo: paixões,
amores, desamores, amizades.
Falta o preço e o prazo de validade.
Sou, portanto, um replicant perigoso!
Ou como diria o Alexandre
(O’Neill), um long runner.
“O homem que pedala, que ped’alma
com o passado a tiracolo,
ao ar vivaz abre as narinas:
tem o porvir na pedaleira.”.

20 comments:

Vulcano Lover said...

Não conhecia. Tens de me recomendar cinema português, sempre o achei um bocado duro e difícil. Mas há de haver bom cinema em Portugal também...
Beijos, no dia europeio da música... Em Madrid faz um dia tão lindo, com 20 graus e uma brisa fresquinha que vem da serra. Saio agora disfrutar as inúmeras actividades musicais que foram programadas para celebrar este início do verão, este solstício, esta próxima noite de São Jõao, neste fim de semana irrepetível... tomara pudesses cá estar, amigo.
Boa noite, e um abraço

Maria said...

Vi alguns filmes do Fernando Lopes.
Não li o JL (confesso que ando preguiçosa para jornais), por isso quero agradecer-te a partilha que fazes comigo sobre parte desta interessante autobiografia...

Pela frontalidade, fiquei a gostar ainda mais dele.

Beijinhos

Unknown said...

A mim... o desconcerto veio pelo desespero.
Um abraço.

Páginas Soltas said...

Realmente é uma falha minha...
gostar mais do cimena que nos entra pelos ecrans de países que apostam fortemente nesta Arte!~

Também uma falha ( mais uma) do nosso pequeno rectangulo á beira mar... não dar oportunidades aos cineastas.. .para mostrarem que em Portugal também se faz cinema com qualidade!

Obrigada Luis... por estas sugestões.. tudo o que vem de ti é salutar!

Beijos da

Maria

Art&Tal said...

interessante

Ka said...

Frontalidade e sinceridade, duas característricas que prezo muito... e a simplicidade com que as mostrou é deliciosa. Adorei a parte final (do código de barras)...acho mesmo que todos temos.

Beijinho

Luiz Carlos Reis said...

Meu Caro o sincronismo perfeito do cinéfilo e sua arte...Um dueto singular.
Obrigado pela visita ao Oficina, És bem vindo!

Grande abraço!

un dress said...

mama mia ...!!

belíssimo e tão.tão.coerente!
tão verde!!



*

Moura ao Luar said...

Um beijo de bom fim de semana (agora com o calor fico sem paciência para ver filmes, gosto de ver em casa, com uma mantinha e as pipocas e silêncio, barulho só o da chuva lá fora)

Mar Arável said...

MAIS UM BELO E COERENTE TEXTO - UM CAMINHO A CAMINHAR-

ABRAÇO AMIGO

Chawca said...

Não conheço nada dele...
Mas não custa nada dar uma conferida..
Estou acabando de ler Memorias de Adriano e achei o livro o máximo, escrevi um pouco sobre ele lá no blog...
Obrigado pela dica, um abraço

Alberto Oliveira said...

... não li esta entrevista. Aliás, há mesmo bastante tempo que não leio o JL. Porquê? Não me apetece, prontos.

O Fernando Lopes é um gajo interessante e a exemplo de outros portugueses das artes deixou-se ficar cá pelo burgo.

Acho que vi todos os filmes dele (do mesmo não se podem gabar?! outros realizadores lusos do seu tempo), à excepção dos dois últimos. "Belarmino" (pela novidade) e "O Delfim", considero-os os melhores.

"Estou onde não devia estar"
(um lamento tão comum ou a desapontada portugalidade cultural. até quando?)

bom fim de semana.

Maria Faia said...

Olá Luis,

Pela beleza, franqueza e sabedoria das palavras, deixei-te um "recadinho" no Querubim.

Beijinho

teresamaremar said...

Boa noite Luís

Deixei umas palavras para si no NasTintas

Telejornalismo Fabico said...

*



e quantos de nós poderiam dizer que foram aquilo que se esperavam que fôssemos?

poucos, pouquíssimos.



*

Fernando Pinto said...

Boa tarde, amigo Luís!

Quando vejo algo sobre este realizador lembro-me, como é óbvio, do "Novo Cinema português". Para quem não viu "Belarmino" (1964) e "Uma Abelha na Chuva" (1971) ficam a saber que estas duas películas foram restauradas e editadas em DVD, pela Madragoa Filmes (com o apoio do Instituto do Cinema, Audiovisual e Multimédia), vai fazer cinco anos. Dois títulos essenciais do Novo Cinema português.

Abraço,
Fernando

Jonice said...

Verdade, franqueza e beleza fazem juntas mais do que rimar!
Beijinho :)

M&S said...

Afinal há erros bons!?... :)

Anonymous said...

Voltar a sentar-me nesta plateia, ler com a calma de uma tarde de Verão o que escreves, é sempre uma delícia.
Andei ausente ... "ausente dos homens e das flores", como escrevi num poemita que está na minha "maresiademel". Aos poucos estou a acordar de um sono de mil anos. Enfim, "brother", perdoa.
Voltei, é o que basta.

Posto isto, serei quem sabe, mais um erro sociológico

"Aviso: o abaixo assinado têm código de barras.
Numa leitura electrónica está lá tudo: paixões,
amores, desamores, amizades.
Falta o preço e o prazo de validade.". Aplica-se, Luís....

O prazo andou quase a expirar. Pedi uma prorrogação ao divino... rsrsrs...

Adorei esta crónica. Vou descer, vou ler as que não li... Hoje tenho todo o tempo do mundo...

Bjs, querido Luís. Muito saudosos e fraternos

Mel
www.noitedemel.blogs.sapo.pt
www.maresiademel.blogs.sapo.pt

Alexandre said...

Excelente referência a um cineasta que nunca teve o destaque que merecia!

Um abraço!!!