Uma elegante Lady Chatterley, assinada por Pascal Ferran, adaptação do romance de D. H. Lawrence, retratando uma paixão carnal que se transforma num amor profundo, foi a minha escolha de fim de tarde chuvoso, com ar de Outono, de ontem, numa sala não muito agradável do cinema Monumental. Depois de lido o romance há alguns anos, fiquei perante uma Constance ligeiramente diferente, uma mulher que, no seu castelo, vive dias monótonos, cismada no seu casamento e no sentido do dever, uma aristocrata que vive com um marido confinado a uma cadeira de rodas, vítima da I Guerra Mundial. Numa das suas incursões pela quinta, sente um forte desejo físico ao ver o torso de um homem, nu, a banhar-se – e percebe que a sua sexualidade está reprimida. Para o homem (o couteiro da quinta), a relação amorosa servirá também de redenção para a vida. O filme é a história deles. A narrativa de um encontro, de uma domesticação delicada, de um despertar para a sensualidade nela, de um longo retorno à vida para ele. O que se poderia esperar em 2007 de uma nova adaptação do texto de D.H. Lawrence? Tudo menos uma versão determinada em explorar exclusivamente a vertente sexual. O desafio, numa época em que o sexo explícito conquistou um lugar no cinema dito sério (ver a propósito post sobre Shortbus), seria precisamente fugir a essa posição exploratória. E foi conseguido, pese os excessivos 158 minutos de duração.
D. H. Lawrence é conhecido por uma série de obras que desafiaram os valores da época, nomeadamente em torno das questões sexuais. De entre as suas obras mais conhecidas, notórias pelo escândalo, é sem dúvida a Lady Chatterley and the Man of the Woods, cuja edição seria proibida, passando a circular de uma forma clandestina. Contudo, saí da sala de cinema com a certeza de que não é de todo irrelevante que esta adaptação tenha sido dirigida por uma mulher. É, sem dúvida, a afirmação da legitimidade do prazer feminino um dos temas preferenciais do filme, recordando-nos, na subtileza das suas imagens, na sua sensibilidade, que o erotismo e a sensualidade se encontram à nossa volta e que nos pode contagiar com um olhar.
Depois, há a riqueza da construção narrativa, o tom delicado da fotografia, a vedação que desejamos atravessar tanto como a inglesa Constance Chatterley, os corpos em comunhão de Marina Hands e Jean-Louis Coullo'ch, as mãos da actriz, a atenção da mise-en-scéne a cada detalhe. Fui sensível ao momento em que Constance diz a Parkin que, dali para a frente, eles não se verão durante algum tempo, mas que isso é irrelevante, porque, naquele instante, ele já é outro homem e ela outra mulher. No final, começa o romance…
Apetece reler Lawrence e verificar se isso fazia parte da narrativa, mas quase aposto que não. Bem vindos os olhares femininos aos clássicos da literatura, porque fazem a diferença, ainda que nos pormenores.
D. H. Lawrence é conhecido por uma série de obras que desafiaram os valores da época, nomeadamente em torno das questões sexuais. De entre as suas obras mais conhecidas, notórias pelo escândalo, é sem dúvida a Lady Chatterley and the Man of the Woods, cuja edição seria proibida, passando a circular de uma forma clandestina. Contudo, saí da sala de cinema com a certeza de que não é de todo irrelevante que esta adaptação tenha sido dirigida por uma mulher. É, sem dúvida, a afirmação da legitimidade do prazer feminino um dos temas preferenciais do filme, recordando-nos, na subtileza das suas imagens, na sua sensibilidade, que o erotismo e a sensualidade se encontram à nossa volta e que nos pode contagiar com um olhar.
Depois, há a riqueza da construção narrativa, o tom delicado da fotografia, a vedação que desejamos atravessar tanto como a inglesa Constance Chatterley, os corpos em comunhão de Marina Hands e Jean-Louis Coullo'ch, as mãos da actriz, a atenção da mise-en-scéne a cada detalhe. Fui sensível ao momento em que Constance diz a Parkin que, dali para a frente, eles não se verão durante algum tempo, mas que isso é irrelevante, porque, naquele instante, ele já é outro homem e ela outra mulher. No final, começa o romance…
Apetece reler Lawrence e verificar se isso fazia parte da narrativa, mas quase aposto que não. Bem vindos os olhares femininos aos clássicos da literatura, porque fazem a diferença, ainda que nos pormenores.
Lady Chatterley - trailer
18 comments:
Ando com vontade de ir ao cinema... :)
Gostei muito do que por aqui encontrei ...
Gostei e voltarei.
_________
Agora reparei na fotografia aqui ao lado e reconheci-a (lembrei-me, então, que já aqui tinha estado e gostado !
Abraço
A propósito do post anterior, a leitura de Ulisses foi fantástica, uma abretura ao romance de forma não convencional, uma aventura.!
Excelentíssimo blog!
Li há muitos anos atrás. Creio ter visto em episódios há também alguns anos (terei visto ou é o tempo a enganar-me e as imagens que tenho são as que eu mesma construi após leitura?)
Mas como essa nova visão, certamente a (re)ver. Ainda há quem diga que não há escrita no feminino... dizeres.
O olhar feminino será sempre necessariamente outro.
Os olhares femininos fazem a diferença em tanta coisa, Luís...
O teu blog continua a ser fundamental, é quando aqui venho que me apetecia que o dia tivesse 48 horas...
Olha, a sexualidade da D. Maria não está nada reprimida.
Basta ver o que se passou neste sábado.
Coelhinho
li a opinião da frioleiras e agora a tua: irei ver o filme.
Abraço.
Eu também dediquei a minha tarde de domingo ao cinema. Ainda bem: vi Paz Vega cheia de talento a interpretar a apaixonada Santa Teresa de Ávila em "Teresa, O Corpo de Cristo".
LADY CHATTERLEY’S LOVER
Já lá vão muitos anos quando li este romance de David Herbert Lawrence, teria para aí os meus 16 anos de idade. Na altura aquela paixão carnal fascinou-me; a sensualidade daquele romance pôs-me mesmo os pêlos da puberdade em pé. Agora, já só tenho uma vaga recordação desse romance. Mas, a seguir à leitura da sua excelente recensação sobre o filme, deu-me um desejo imenso de o reler . Depois de o ter procurado, durante horas a fio, encontrei-o num canto do meu sótão, todo cheio de pó, o título praticamente ilegível e as folhas já não são brancas, mas sim amareladas. É uma edição do Círculo de Leitores. Hoje à noite vou começar a relê-lo.
Como David Herbert Lawrence tambérm foi, para além de romancista, contista e ensaista, um grande poeta, aqui vai um poema dele em tradução de Jorge de Sena.
A barca da morte:
III
E pode um homem fazer a sua quietude
Como um punhal desnudo?
Com adagas, punhais, balas, pode um homem
Fazer uma chaga ou abertura para que a vida se escape;
Mas é isso quietude, diz-me, é quietude?
Por certo que não ! Pois como pode um crime, mesmo contra si mesmo,
Jamais criar quietude?
Também gosto de cinema.Fiquei com vontade de ir ver este filme.Li o livro há algum tempo atrás .
Voltarei
bj
e nos pormenores é que é se faz a diferença.
a vida é feita de pequenos pormenores
Foi uma leitura marcante para mim quando apenas iria começar a ser adulta. Lembro que gostei muito. Tomara este filme chegue logo em terra brasilis.
Beijinho :)
Nunca gostei muito de comparar livros com filmes... São "realidades" díspares e ainda bem! Gosto de saborear a leitura que um realizador faz de uma obra, porque quando leio o livro que lhe serviu de ponto de partida só eu visto a pele de cineasta, só eu grito ACÇÃO, só eu grito CORTA!
Abraço,
Fernando Manuel
Gostei,,,esta muito giro;)
Bj Lua
Os pormenores fazem a diferença, deixaste-me curiosa sobre o livro... prefiro o livro ao filme na maioria das vezes... permite-me ser a realizadora :-)
gostei muito de como Pascal Ferran leu e dá a ler Lawrence: o "à flor da pele" simple, vindo do dentro de nós.
li muito lawrence na faculdade ...
e apesar de obrigatório gostei tanto das viagens nos seus livros ...!
cinema ...ando arredada. preciso mesmo de parar com esta paragem ...
bom.dia.beijO
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